Especialistas apontaram, em seminário realizado nesta quarta-feira (23), na Câmara dos Deputados, alguns desafios para a eventual participação popular no Orçamento da União. O chamado orçamento participativo foi defendido pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a campanha deste ano.
A gestora pública Kátia Lima, ex-coordenadora da Rede Brasileira do Orçamento Participativo (RBOP), afirmou que as instâncias deliberativas exigem atenção para assegurar a efetiva participação popular nas leis orçamentárias. Ela defendeu campanhas para engajamento da população, de gestores e dos entes federativos.
“Há experiências de orçamento participativo em nível federal em outros países, como Portugal, e é possível buscar subsídios para ajudar”, comentou Kátia Lima. Segundo ela, a RBOP já iniciou consultas sobre o tema entre os seus integrantes.
O presidente do Sindicato Nacional dos Servidores do Ipea (Afipea Sindical), José Celso Cardoso Júnior, defendeu a revisão do arcabouço das finanças públicas no Brasil. “Pelas premissas atuais, há uma dominância do financeiro sobre o social”, disse. Na visão dele, o orçamento participativo poderia mudaria as prioridades.
Cardoso Júnior defendeu que os dispêndios do governo complementam os gastos privados e contribuem para o desenvolvimento econômico. “Se não houvesse gasto público, não haveria Brasília nem as pirâmides do Egito”, exemplificou.
Ainda no evento, o gestor público e professor da Universidade de Brasília (UnB) João Mendes da Rocha Neto citou vários problemas no sistema orçamentário, que passam pela dificuldade da população com termos técnicos e alcançam a falta de transparência e a efetiva responsabilização (“accountability”).
“Não podemos fazer uma construção democrática de Estado e de sociedade sem que a gente pense em trazer a população e também os atores qualificados para as discussões que interessam ao País como um todo”, disse Rocha Neto. Segundo ele, a participação popular no Orçamento é hoje mais passiva do que ativa.
Já a economista Vilma Pinto, da diretoria da Instituição Fiscal Independente (IFI) – entidade ligada ao Senado –, apresentou a importância das regras fiscais para o equilíbrio das contas públicas. Ela observou que, desde 2019, foram aprovadas cinco emendas constitucionais a fim de contornar as normas então vigentes.
Emendas parlamentares
A consultora da Câmara dos Deputados Júlia Alves Marinho Rodrigues disse que a elaboração do Orçamento com emendas parlamentares impacta a formação da governabilidade. Nesse sentido, as emendas de relator-geral, as chamadas RP-9, converteram-se em uma alternativa para os Poderes Legislativo e Executivo.
Ela lembrou que, após o regime militar (1964-1985) e com a Constituição de 1988, o Legislativo recuperou a atuação sobre o Orçamento, como em outros países. Em 2014, surgiram as emendas parlamentares impositivas, de execução obrigatória pelo Executivo. Em contraponto, as RP-9 demandam negociação entre Poderes.
Na última segunda-feira (21), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), voltou a defender as atuais emendas de relator-geral e criticou aqueles que chamam de “orçamento secreto” essa prática. “O Orçamento é impositivo na sua totalidade. Depois da sua discussão, o Executivo tem de cumprir”, afirmou.
Segundo Lira, o Orçamento da União atualmente é municipalista e democrático, pois “não está nas mãos de um único ministro, que decide monocraticamente” para onde vão os recursos previstos nas emendas de relator-geral.
A versão original do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2023 reserva R$ 38,4 bilhões para emendas individuais, de bancada estadual e de relator-geral. Na proposta (PLN 32/22), as RP-9 são R$ 19,4 bilhões, ou 50,5%.
Mín. 22° Máx. 36°